O lado ruim da nossa vida

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Ilustração por Claudio Brites

Tudo na vida tem um lado bom, menos o Bolsonaro.

Um tracinho de humanidade, de empatia, de piedade: não tem. Pode revirar a biografia dele que não vai encontrar. Não existe. Não há.

Vejamos.

Passou a infância na pitoresca Xiririca, no interior paulista, onde tomava couro de uma vizinha chamada Narcisa, a quem chamava de gorda, baleia e saco de areia. Saiu aos dezoito anos para cursar o preparatório do exército. Vendo o sujeito incapaz de um pensamento lógico, de elaborar uma frase sem três erros de gramática e de fazer uma conta simples, ninguém entende como entrou nas Agulhas Negras. Mas entrou, primeiro cadete medíocre, depois oficial sem ética que traçou um tresloucado plano para explodir sedes militares no Rio de Janeiro.

Não foram anos de formação, foram anos de deformação.

Tudo na vida tem um lado bom, menos o Bolsonaro.

Fora do exército, em 28 anos de uma carreira política inútil, defendeu a ditadura, a pena de morte, a redução da maioridade penal, o armamento da população e a violência contra mulheres, gays e pessoas vulneráveis em geral. Transformou os três filhos em políticos provando ser, acima de tudo, um homem de família. Eleito presidente, potencializou a própria ruindade. Deu poder a grileiros, desmatou a rodo, aprovou – até agora – quinhentos e noventa agrotóxicos. Desmontou órgãos e acabou com o cinema, os museus, a cultura. Misturou religião com educação, desassistiu quem precisava, vendeu cloroquina, não comprou vacina, espalhou mentiras sobre a vacina, espalhou vírus, espalhou fake news sobre a pandemia, sobre adversários, sobre o STF, sobre o sistema eleitoral do país.

Tudo na vida tem um lado bom, menos o Bolsonaro.

Hoje passeia de motocicleta com cidadãos de bem na andropausa, aplaudido por tias saídas em hordas de bingos clandestinos, todos em uma cruzada pelo voto escrito com bic, a milícia e os sinhozinhos ajudando os indecisos a preencher o número da reeleição. Que, a essa altura, ele ainda nem sabe qual é.

Ou melhor, sabe.

Quase seiscentos mil mortos.

Tudo na vida tem um lado bom, menos o Bolsonaro.

É escritora e roteirista de Porto Alegre. Trabalha na TV Globo, é colunista do jornal Zero Hora e colaboradora da revista Parêntese. Chega à Coluna de Terça sabendo da responsabilidade que é estar entre tantas vozes importantes.

somos a primeira voz
que você ouve pela manhã.
a última com você na cama.

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