Nem casamento (nem a vida) traz felicidade. Parem de ser narcisistas.

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Eu estou no meu TERCEIRO relacionamento duradouro.
Estou casado a 8 anos.

Meu primeiro casamento foram 6 anos, o segundo 5, ao todo, são 19 anos em situação de casado. Não com a mesma pessoa, mas faz 19 anos que eu tô aí, nesse ramo.

Então, sendo uma pessoa do ramo, eu posso arriscar uma coisa:

Casamento não é pra ser feliz.

Acho que quem inventou isso, inventou também o Rivotril.
Porque sabia que ia vender uma ilusão, e a frustração ia lançar corpos nas valas da depressão, à balde, então, o camarada que inventou a felicidade no casamento foi malandro, e inventou o remédio pra depressão, SABENDO que não tem felicidade.

Ele ampliou os negócios e inventou a terapia de casal.

O safado ganha de todos os lados. Vende lenço, não interessa quem chora, ele vende lenço. Vai tomar no butico.

Quem inventou relacionamento romântico foram os ingleses, pra depois inventarem a loja de vestidos de noivas, os serviços de buffet, os serviços de DJ de festa, os serviços de fotógrafos, os serviços de maquiadoras, ou seja, TUDO é dinheiro, amado.

Os conges que lutem pra sair do SPC depois. Entram no casamento e no SERASA ao mesmo tempo. Já na igreja, fazem o voto de saúde, de doença e de confissão de dívida e reparcelamento com o Santander, na grande promoção Limpa Nome.

Eita, classe média, classe desgraça.

A vida é um cachaçal. A gente pagando boleto sem nem ver mais o nome timbrado, não sabe se é TIM, Vivo, Net, IURD, fodace, taca Bradesco entrando no limite, pagando tudo com celular numa mão, comendo resto de bolo salgado decorado com tomate enrolado em formato de rosa,  na outra, maionese escorrendo nos dedos, o cheiro do atum que convoca o cachorro, que monta em você de piroca dura, querendo aquele bolo de pão de forma úmido e dormido, lambendo a tua língua, misturando o sabor da ervilha no meio do molho com as tuas lágrimas, um todo agridoce.

E isso é só o começo.

A Light vai chegar de tarde, pra cortar a luz.

E vocês querendo felicidade no casamento, olha. O brasileiro sofre por falta de um projeto de educação.

Eu não tô demonizando o casamento, veje bem. Eu tô quase 20 anos no ramo. Sei as fases. Todas. Inclusive a do dia do divórcio. Ou a de descobrir que é corno. Tudo.

Mas quem inventou que você seria feliz casando, foi a mesma pessoa que disse que você seria feliz trabalhando no que ama.


Trabalhe com o que ama, e nunca mais amará nada.

Balela pra uma geração que era adolescente no período Lula, país como, bombando mais que Instagram do Arthur do Val com comentário de feminista do PSOL, economia lá na casa do caralho, SEXTA economia do mundo, hoje é décima terceira, aí algum coach safado disse que não podia contrariar os menó.

Deu nessa geração.

Pra muitos, não sei se concordo, mas pra muitos: ingênua, perdida, sem foco, sem talentos, sem dinheiro, sem passado, sem presente e sem futuro.

Praticamente, eu a vida toda. Uma geração de Andersons, novinha em folha. Eta porra.

Uma geração que não curte “esse negócio de posse”, por isso envereda em alugar “studio” em São Paulo, um fosso de 5 metros quadrados, com um caixão e um Prestobarba compartilhado com um véio bruto de Alagoas, pagando 3 mil reais e dizendo que isso é hype. Porque pra eles, ostentação é Coliving, onde todos tem, pasme, UM QUARTO INTEIRO só pra si. É muito ultrapassado, sentimento de posse, insustentável num mundo que o veganismo venceu.

Essa é outra marmota.

Sujeito opta por proteínas vegetais, ou sintéticas, e condena quem compra dois bife de alcatra pra fazer o churrasco do semestre. Quem come carne, os CARNISTA, deve ter parcelamento de apartamento na Caixa. Povo tacanho. Vai ver tem carro, movido a combustível fóssil. Esses atrasado que dirige carro.

Esses atrasado que dirige carro que tu chama no Uber pra te buscar na festinha poliamor. Outra merda que, na essência, é boa, no meu tempo chamava amante, biscate, nome que o povo dava, eu era criança, mas o povo nem sempre procura poliamor porque é bom. Procura porque não dá conta nem de um relacionamento, aí se joga num saco de gato, várias pessoa perdida se arranhando, pra depois dar errado e todo mundo fazer post no Facebook culpando o outro pelo seu fracasso e sua alastrante incapacidade de se relacionar com a vida.

Tu não consegue nem um namoro de 4 meses, só um Tinder de 10 minutos, e quer falar de poliamor como evolução da monogamia. Tu nunca nem manteve um relacionamento monogâmico até os ossos necrosarem dentro das carnes, condição sine qua non pra qualquer monogâmico que se preze: tristeza profunda, amargura e ideação suicida no café da manhã –  e quer viver poliamor.

Uma coisa é dar e receber xerecada e pirocada. Outra é se RELACIONAR com várias pessoas. Alexandre Pires que o diga.

Tô fazendo amor com oito pessoas. Mas meu coração VAI SER PRA SEMPRE SEU.

O cara comendo gerau, mas numa relação afetiva exclusiva, nos linguajar moderno.

É muita derrota. Uma geração que pega tudo emprestado, até o conceito que vai definir suas relações.

Mas vai, é essa geração que acredita que tem que ser feliz no casamento.
Eu não sou feliz no casamento.

Porque eu não sou feliz. Não sou uma pessoa feliz NA VIDA. E isso é coisa minha, da minha terapia e dos despacho que eu deito.

Aprendi que dá pra viver com uma pessoa mesmo quando os dois dormem dentro de um pote de VINAGRE com sal. Casamento não é pra dar felicidade, casamento é pra dar neurose. E os bigode grosso que tão me lendo sabem.

E a gente ri disso. E ri de quem se horroriza. Os coach de noivado tudo pira.

Minha esposa, por exemplo, pensa e age de formas totalmente diferentes de mim, hoje. Eu olho pra ela, e por vezes não reconheço a pessoa com quem casei. Antes, feliz, uma paixão ensandecida, um sexo voraz, uma libertinagem, uns ménage loko; hoje, sai muito cedo, volta muito tarde, fala duas, três palavras que eu, por já conhecer, sei que significam: “não esquece de tirar o lixo, leva os cachorro pra cagar, chegou uma conta nova do plano de saúde, tô pré-diabética, teu pau tá diminuindo”.

Fala isso tudo, com dois gemidos de dor. Antes de entrar pra terapia, pros medicamentos, sair de lá chorando. A diferença pra mim é que eu não choro, eu escrevo.

Casamento, queridos.

Discordo dela um monte, e ela de mim. Nem sei que música ela ouve mais.
Mas aí cê vai dizer: caralho. Isso é saudável?

Amiga.
Peida não. Te enganaram a vida toda. Felicidade é passar o cartão e piscar: TRANSAÇÃO AUTORIZADA. Dura 3 segundos, e é melhor que uma gozada.

Vocês precisam amadurecer. Casamento é essa parada aí, esse cansaço, essa trauletada na boca com uma ripa de pau de obra. Mas tem que ter coisas que sejam suficientemente sólidas pra te manter nele.

Mesmo que por sólido seja o ódio a si mesmo.
Mas parem de achar que casamento traz felicidade. Casamento é casamento, gente, sem drama. Nem bom, nem ruim. Bom é borda recheada de catupiry em pizza de calabresa.

E tá tudo bem o mundo, o casamento, o emprego, o corpo e a vida, essa coisa finita e cambaleante, ser incompleta, vazia, manca e acabar aos poucos.

Cês se acham seres eternos, merecedores de histórias gloriosas, esse narcisismo incontrolável. São um saco de carne e osso, que mais dia, menos dia, vai ser um perfil de Facebook sem atualizações.

Não existe felicidade.
Aceitem isso, e tudo fica mais fácil.

Vou ali medir a glicose.


Escritor e ativista social, nascido em Madureira, Rio de Janeiro. Em 2016 lançou Rio em Shamas, indicado ao Jabuti de 2017, pela Editora Objetiva. Foi roteirista na Rede Globo e Multishow/A Fábrica, colunista da Folha de São Paulo e Metrópoles.

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