Repressão real
Leitura: 4 minNesta quarta-feira (07/12), uma massiva série de operações policiais foram realizadas em toda a Alemanha, bem como na Itália e na Áustria, com objetivo de desestruturar o que foi chamado de “potencial formação de organização terrorista” e cumprir mandados de prisão contra Reichsbürger:innen (pessoas ligadas ao movimento de extrema-direita Reichsbürger, “Cidadãos do Reich”, o Império Alemão, os quais têm como mote serem grupos revisionistas históricos e anticonstitucionais) e Querdenker:innen (pessoas que abertamente acreditam em teorias da conspiração, como QAnon). Entre outras acusações, há indícios de haver planos para um ataque ao Bundestag, o parlamento alemão.
O Ministério Público Federal alemão acusa um total de cerca de 50 homens e mulheres de terem formado uma organização terrorista a fim de eliminar a ordem constitucional da República Federal da Alemanha e, assim, estabelecer um novo Estado baseado no modelo do Reich alemão de 1871, que contava com Otto von Bismarck como Chanceler Imperial e a figura máxima, o Imperador e Rei da Prússia, Wilhelm I.
De acordo com uma porta-voz do Procurador-Geral, 3.000 agentes da polícia estiveram em ação. A ofensiva ocorreu em onze estados todo o país, com buscas em 130 casas. 25 pessoas foram presas. Não houve registro de mortos ou feridos (esta estatística é para a PM do Rio).
22 alemães foram presos acusados de “filiação a uma organização terrorista”. Em Perugia, na Itália, e em Kitzbuehel, na Áustria, também ocorreram prisões (uma em cada cidade). A última das pessoas detidas é uma mulher russa. Estas três pessoas são suspeitas de integrar e apoiar a organização, segundo autoridades.
Os promotores federais apontam que um dos líderes desta organização terrorista se denomina príncipe. Heinrich XIII R., 71 anos, é herdeiro de uma pequena família nobre alemã principesca há muito estabelecida no que é agora Thüringen, e vive hoje em Frankfurt. O outro líder seria Rüdiger von P., de 69 anos, ex-comandante de paraquedistas, expulso da corporação devido à venda não autorizada de armas dos estoques do antigo exército da Alemanha Oriental. Seus nomes estão protegidos de acordo com regras alemãs sobre privacidade.
Segundo informa a DW Brasil, a investigação aponta que Heinrich – que seria alçado a novo líder da Alemanha, tendo Rüdiger como seu chefe militar – havia contatado autoridades russas com o objetivo de negociar uma nova ordem no país assim que conseguissem derrubar o governo. Ele teria sido supostamente auxiliado por uma mulher, Vitalia B., justamente a russa detida. Não há, entretanto, informações de que ele teria obtido resposta.
Segundo a rede alemã ZDF, outra pessoa detida foi identificada como Birgit M.-W., antiga deputada da sigla partidária de extrema-direita AfD (Alternative für Deutschland, Alternativa para a Alemanha). Cada vez mais, o partido está sendo observado pelas autoridades de segurança alemães em virtude de seus vínculos com extremistas de direita em todo o mundo, inclusive no Brasil. Vale lembrar, Beatrix von Storch, neta de nazista e deputada alemã do AfD, foi uma das raríssimas figuras políticas que acenou em apoio a Bolsonaro no Brasil.
É provável que esta seja uma das maiores operações de busca no campo da suspeita de terrorismo. O Ministro da Justiça Federal Marco Buschmann (FDP) escreveu no Twitter que “estava planejado um ataque armado a órgãos constitucionais”.
O periódico DW Brasil noticia também que, segundo os promotores, os detidos formaram no ano passado uma “organização terrorista com o objetivo de derrubar a ordem estatal existente na Alemanha e substituí-la por sua própria forma de Estado, que já estava em vias de ser fundada”. Os suspeitos estavam cientes de que o objetivo só poderia ser alcançado por meios militares e pela força, disseram os promotores. Por isso, o grupo procurava recrutar membros das Forças Armadas alemãs, a Bundeswehr, e da polícia, homens com treino militar especial. Por essa razão, o grupo é considerado particularmente perigoso e, claro, também armado.
O Procurador-Geral, em pronunciamento transmitido pela ZDF heute, considerou as operações bem-sucedidas e reiterou se tratar de uma organização terrorista que se formou em torno de Heinrich R. em novembro de 2021. E reafirmou ainda que “a organização estabeleceu para si o objetivo de eliminar a ordem estatal existente na Alemanha, a ordem básica democrática livre, utilizando para tal a violência e os meios militares.”
Qualquer semelhança não é mera coincidência. Definitivamente, não há como não pensar no que estamos vendo desde 31 de outubro em solo tupiniquim. Todas as manifestações golpistas e antidemocráticas implorando aos militares uma intervenção completamente inconstitucional são um delírio geral que não há quem entenda. A intervenção do pneu, ou ainda uma intervenção alienígena. Com antenas “Haarp” para fazer chover em seus acampamentos. Tudo isso é absurdo demais para ser verdade.
Não é, entretanto, cômico. Em verdade, deixou de ser. O que parecia ser só delírio coletivo com suspeita de abuso de cloroquina, agora toma outros contornos. O fato de um empresário bolsonarista, Milton Baldin, ter sido preso (6/12) por ter convocado, no último dia 26 de novembro, patriotas que tenham “armas legais”, ou seja, Caçadores, Atiradores e Colecionadores, os CACs, para protestar na frente de um Quartel-General do Exército, em Brasília, acende uma luz vermelha fortíssima.
A posse de Lula, em janeiro, será um acontecimento. Histórico. E dirá muito sobre os rumos do país. Alemanha e Estados Unidos estarão de olho no que vai acontecer aqui. Estão firmes na repressão de “golpes” em casa, mas estarão de olho aqui.