Sobre ressignificar opressões
Leitura: 2 minJá faz um tempo que tem me incomodado esse movimento de ressignificar opressões, principalmente machistas, que vai desde a maneira como escolhemos falar e nos expressar até a forma como marcas, músicas e movimentos vendem ideias nessa sociedade capitalista e misógina em que vivemos.
Quando teve a primeira Marcha das Vadias, surgida no Canadá e depois no Brasil e em vários outros países do mundo, em 2011, que era contra a culpabilização do corpo feminino e da vítima, e que tinha como premissa o fato de suas participantes se vestirem de maneira que fossem consideradas “vadias” (ou “sluts” no inglês), começou-se a ressignificar o termo. O argumento, que inclusive a que eu aderi, era o seguinte: “Se ser vadia é ser livre, eu sou vadia”.
E esse pensamento/movimento começou, consequentemente, a se refletir na língua, até chegar ao ponto em que estamos hoje, em que “ser amiga” ou ser “leal ou fiel” virou ser chamada de “cachorrinha”; ser livre e bem resolvida com sua vida sexual e com seus desejos virou ser “piranha”, “vadia”, “kenga” ou “puta”, etc.
E chegou inclusive aos homens gays, que insistem em chamar suas amigas de piranhas, putas e vadias quando elas resolvem exercer livremente seu direito de gozar e sentir desejo.
Não sei se tu entende, mas quando tu chama tua amiga de piranha simplesmente porque ela se sentiu atraída por mais de um cara ou porque saiu com mais de um e exerceu seu livre direito como mulher e pessoa, você tá perpetuando uma série de estereótipos com que ainda lidamos. “Ah, mas eu sou gay, como posso ser misógino?” Sendo, meu bem. Essa é a questão: enquanto vocês riem e nos chamam de putas, piranhas e afins, seguimos sendo tratadas e vistas como tal por todos os outros e pela sociedade. É depreciativo, é misógino. Esses termos dizem sobre a nossa falta de liberdade. Nada contra putas, mas contra o que é ser considerada puta nessa sociedade.
Estou cansada de ser tratada como tal só porque tento minimamente exercer a liberdade dos meus desejos. Estou cansada de ser julgada por quem eu sou, pelo que eu visto, e de ter o meu valor como pessoa diminuído por isso. Na real, isso diz muito mais sobre você do que sobre mim.