Ainda sobre o debate
Leitura: 4 minAna Elisa Santiago
Neste domingo, Bolsonaro fez o que sabe fazer de melhor: mentir. E ofender mulheres, claro. Não adianta agora vir aqui apresentar os números corretos ou manifestar repúdio sobre as suas falas. Ele falou ao público dele. O gado foi ao delírio. E ninguém vai checar o que era verdade e o que não era. O material de campanha saiu prontinho ali do debate. Os grupos do telegram e whatsapp devem estar bombando.
Ele teve a audácia de perguntar sobre corrupção. De inventar números absurdos da Petrobras. De chamar Lula de ex-presidiário e mentiroso várias vezes.
Que fique claro: essa é uma estratégia militar antiga de guerras psicológicas. Você acusa seu adversário daquilo que você mesmo faz ou é. Isso é assunto para um próximo texto, mas é importante frisar que quem aciona essa narrativa, e não encontra resistência, domina o campo oposto facilmente. E foi isso que aconteceu em rede nacional.
Lula poderia ter dado o tom logo no primeiro bloco. Não o fez.
E pagou por isso o resto do debate.
Poderia ter contestado os números falsos. Quem em sã consciência pode acreditar em roubo de 900 bilhões quando o valor da Petrobras é menor que isso?! Lula deixou barato as trocas consecutivas da presidência, o que gerou, inclusive, a desvalorização de 20%, que equivale a 100bi no valor da empresa. Não falou sequer do aumento nos preços dos combustíveis desde o golpe contra a Dilma até agora.
Lula não falou de rachadinha. Não questionou por que o vizinho do Bolsonaro matou a Marielle. Não perguntou por que o Lira engavetou 130 pedidos de impeachment contra o presidente. Não falou da propina de 1 dólar na compra de vacinas e nem da negligência com os estoques de oxigênio que resultou no sofrimento e morte de tantos brasileiros.
Não ousou tocar no assunto do fundo eleitoral. Não denunciou a farra dos cartões corporativos. Não mencionou o orçamento secreto e nem o sigilo de 100 anos decretado por Bolsonaro aos dados dele e de sua família (só lembrou disso lá no final, tarde demais).
Vejam bem, em apenas uma questão, Lula poderia ter enquadrado Bolsonaro e encerrado o debate ali.
Tebet fez as honras e, pelo menos sobre a CPI da Covid, não deixou barato. Também, pudera, é sua principal plataforma eleitoral. Mas isso também é assunto para outro texto.
Esse aqui é sobre Lula. Ele mostrou que vai apostar na campanha Paz e Amor de novo. Além de ficar relembrando os tempos áureos do PT. Entendo a estratégia de tentar superar a polarização. Entendo também essa coisa de reviver a memória. Porém tudo tem seu tempo, seu lugar, e seus limites.
Guarda esse discurso para quando estiver falando diretamente ao povo, Lula.
Em um confronto como o de domingo, e como outros que estão por vir, não dá pra perder a oportunidade de bater com força e com propriedade no que deve ser batido. Não dá pra deixar que a direita conservadora nos costumes e liberal na economia, e que até já fez parte deste governo, seja responsável pelos poucos pontos altos da sabatina. Sobretudo, não dá pra deixar o Bolsonaro gerar material de campanha assim tão livremente.
Ainda que não tenha o tal sangue-no-zóio que a gente gostaria, o confronto precisa ser feito. A contestação a todas as mentiras precisa ser melhor explorada, mesmo que em tom brando. A gente já está engolindo a aliança com Alckmin. Agora já não precisa mais ser tão conciliador assim.
Nesta segunda, foi publicada uma pesquisa do IPEC em que Lula aparece com 44% dos votos e Bolsonaro com 32%.
A pesquisa, registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o código BR01979/2022, ouviu 2.000 pessoas entre os dias 26 e 28 de agosto. Ou seja, antes do debate da Band. Mesmo assim, a militância está divulgando como um resultado positivo desse primeiro confronto. O que é extremamente irresponsável neste cenário.
Não é demais repetir: a esquerda precisa urgentemente sair do clima do “já ganhou” e traçar novas estratégias para continuar sonhando com uma vitória no primeiro turno. E sim, estou falando de primeiro turno, quase que com uma esperança pueril. Teremos ainda mais dois ou três debates para decidir estes resultados, seguem as datas: 13/09 na TV Aparecida (ainda não confirmado); 24/09 no SBT; e 29/09 na Globo.
Antes de direcionar os discursos para ganhar eleitores ainda indecisos, é preciso ser coerente com a própria trajetória dessa candidatura.
Não sei quanto a vocês, mas eu espero ainda poder apertar o 13 com um pouco mais de satisfação no dia 02 de outubro.