O cara comeu uma bisnaga inteira

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Eu era aluno de uma escola municipal na minha rua, em Cavalcante, quando tinha 7 anos. Escola Adelmar Tavares.

Uma escolinha bem pequenininha, mas muito danada e com aventura de montão na sua sessão da tarde, com uma turminha DO CARALHO.

Rapaz. Eu estava vivendo minha evasiva e obtusa vida de menino deslocado da sociedade e filho de crente paraíba com 7 anos, quando os outros meninos, e meninas, se juntaram numa espécie de assembléia sindical no recreio, 

e o assunto era um só:

O CARA COMEU UMA BISNAGA INTEIRA.
E sozinho.

O cara era o Alexander. Um bicho grande, devia já ter uns 85 centímetros. Alto demais. Um Golias. Tinha esse nome que combinava com seu comportamento ignorante e autoritário. Um nome meio russo, assim.

Porque desde pequeno, a gente aprendia que russo era ignorante e autoritário. Ditadura né, lindas, as aulas de OSPB metiam pau nos russo. Que as criança russa que disputava Olimpíada não era criança, era uns boneco robô, e na cabeça delas tinha um major russo de 10 centímetros controlando os movimento. Que a criança robô comia invertido. Ao invés da comida entrar, ela se alimentava botando a comida pra fora. Misericórdia. Se eu tinha essa russofobia, aos 7 anos, isso vinha de algum lugar, né.

Viva Pica-Pau e a Voz do Brasil.

Alexander, o DRAGA-VALA da terceira série, comeu uma bisnaga sozinho.

Bisnaga, vocês hoje chamam de BAGUETE. Prejuízos linguísticos que se iniciaram com a chegada do Carrefour, instalado no NorteShopping, em 1987. Mas o pão do Carrefour era bom. Ocorre que era fino, mirrado, e o que chamávamos de BISNAGA, era uma, uma…

UMA PORRA

uma porra grande, grossa, veiuda, crocante, tipo uma tora, uma coxa da Viviane Araújo, um cigarro de maconha que Marcelo D2 fuma antes de tomar café, a ficha corrida de Flávio Bolsonaro: grande.

O filha da puta, pra comer um negócio daquele tamanho, tinha que viver FORA DA PRESENÇA DE DEUS, e DENTRO DA PRESENÇA DE SATANÁS.

E o Alexander comeu uma bisnaga inteira. 

Lembro que eu, por ter comido um pacotinho de balas BANDA, que era umas balinha quadradinha, um colega da sala veio pra cima de mim e disse: seu muleke gordo, desgraçado, seu desgraçado, gordo, bundudo, sujo de caraca, gordo, cheio de mentiras, aviadado, chupeta de baleia, esponja de mau costume, perturbador de Israel, piranha; 

maldito, sujo esmundo, melissa, bucha de corda, capial, lúdico, sem rumo, presta pra nada: comeu a Banda inteira. 

Comi. 

E esse episódio, inclusive, se bem me lembro, foi a primeira vez que vi um futuro comentarista de post de Facebook. 

Resumo é que todo mundo passou a ter medo do Alexander, e isso fez com que ele se tornasse cada vez mais agressivo e antissocial, e hoje ele é pastor bolsonarista e anda armado na Barra da Tijuca. 

Escritor e ativista social, nascido em Madureira, Rio de Janeiro. Em 2016 lançou Rio em Shamas, indicado ao Jabuti de 2017, pela Editora Objetiva. Foi roteirista na Rede Globo e Multishow/A Fábrica, colunista da Folha de São Paulo e Metrópoles.

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