Transcrevendo Vivências: Precoce
Leitura: 2 minDesde nova, quando ainda criança, me foi apontado antes do meu próprio entendimento de que havia algo de errado comigo, também sempre me percebi diferente das demais ao meu redor. Hoje ao recordar da minha infância e juventude me vem à cabeça todas as cobranças e violências que me foram submetidas, apenas por ter sido uma criança viada. Percebo que ainda falamos pouco de como a heterossexualidade compulsória é o estopim na vida de uma criança viada, sapatão e trans.
A cobrança e a pressão vem de todos os lados, “vista isso”; “não ande assim”; “use o cabelo desse jeito”; dentre outros conjuntos de repressões. Acho que só quem foi uma criança queer sabe o tamanho do trauma que carrega na vida adulta por não se enquadrar nos moldes cishéteronormativos [haja terapia, viu].
Lembro de todas as vezes em que fui apontada e de quanto lutei pra me inserir e suprir o tesão que a nossa sociedade tem em colocar pessoas dentro de caixas. Ninguém quer ser um “erro” ou uma “falha”. Mas, quando se cresce com o estigma de demônio, mesmo tentando acertar, essas amarras já não conseguem mais nos privar de sermos quem somos e queremos ser. Então sim, somos um erro social e somos também uma falha, uma falha com a cisgeneridade e com a heterossexualidade compulsória.
Hoje tivemos um avanço grande em comparação a gerações passadas, porém, as pressões sociais continuam, as violências também, e, o Brasil segue em 1º lugar no ranking de país que mais matam pessoas LGBTI+. A falta de acessos e o embarreiramento a uma cidadania plena por ser uma travesti preta, fez retardar meu entendimento enquanto sujeita, o mesmo percebo nas minhas irmãs mais velhas, isso somado a outros condicionantes sociais.
Um desejo e sonho que tenho é que a coletividade abrace, respeite e ame crianças trans, viadas e sapatonas. Acredito nesse movimento. Acredito porque não posso aceitar que o fim das gerações mais novas seja o caminho da violência e morte.