Mulheres que pagam por sexo
Leitura: 4 minSim, esse texto é uma reflexão sobre a diferença entre mulheres que pagam por sexo de HOMENS que pagam por sexo, a partir de uma série do Netflix, que recomendo que você, confinado.
Obviamente, defendo a tese que mulheres são afetivas, companheiras, humanas e extremamente dignas, mesmo em condições onde o poder se faz presente.
Mas esse é um texto que avalia roteiro e curva psicológica dos personagens. Parte da realidade do filme e não tenta consertar essa realidade com militância. De modo que, tanto se você for conservador e
preconceituoso com mulheres que pagam por sexo, quanto militante contra isso, esse texto não foi escrito pra vocês. E não, eu não vou escrever pra viver refém de ninguém. Passa o post, e leia outro.
Bora lá:
o pessoal me pede uma recomendação de série no Netflix ou falar mais sobre cinema, como fiz com o Coringa, vou fazer essa propaganda de graça pra eles, por amor a quem tá em confinamento.
Hollywood, de Ryan Murphy, acabei de ver o episódio tem uns 20 minutos. Enquadramentos condizentes com a linguagem do filme, luz muito boa, figurino lindo, mas eu gosto mesmo é do estrago, e de me aprofundar na história e na CURVA PSICANALÍTICA dos personagens, portanto, senta e ouve:
Tem uma cena, logo no início, de um jovem que se encontra num quarto com uma atriz judia, uma senhora que teve uma carreira no passado do cinema mudo, mas agora está esquecida.
Ela contrata esse jovem pra um programa. E paga, por sexo delícia.
O jovem é um ator sem talento, que procura uma vaga na indústria do cinema, especialmente nos Studios Ace, como figurante. Ele lutou na Segunda Guerra, o filme é na década de 1940.
Mas ele não consegue emprego como ator, e vai trabalhar num posto de gasolina chamado GOLDEN TIPS, nome sugestivo.
Acontece que o posto de gasolina era um negócio testa-de-ferro para prestação de serviços sexuais de garotos de programa, para mulheres, gays e bi.
Esse jovem está em conflito. Descobre que vai ser michê. A cliente chega de carro e diz a senha:
“Quero ir para a Terra dos Sonhos” = “Vamo fudê”
Aqui é o meu ponto.
Há um tempo atrás, fiz um texto sobre uma experiência incidental de michê que passei, digamos que eu fui garoto de programa por dia. Mas não é sobre mim, é sobre como, no filme, a forma como mulheres consomem prostituição difere da forma de homens consumirem prostituição.
Feminismo que é contra prostituição, prostitutas que se defendem deste feminismo à parte, não vim militar, mas observar um ponto:
Esta mulher, uma senhora, foi extremamente elegante, generosa, humana e afetiva com o jovem.
Ela se vestiu com a melhor roupa. Foi para um hotel maravilhoso. Abriu uma champanhe, dividiu com ele. Contou sua história, sem pressa. Olhou nos olhos dele. E depois disso, disse que queria o serviço.
E disse pra ele, de uma forma que só uma sagitariana pode dizer, quando ele pergunta porquê ela o queria na cama:
-Porque você tem uma luz incrível em você, e tudo que eu quero, é um pouco da sua luz.
AMIGO.
A mulher ganhou uma chupada que eu também quis dar nela, pela tela da TV.
E ESSA É A DIFERENÇA.
Mulheres consomem prostituição?
Sim, na década de 1990, a Veja fazia reportagens caça níquel pra falar das “executivas e mulheres que contratam garotos de programa”, como se isso fosse novo, mas isso, no subúrbio de onde venho, SEMPRE teve.
E provavelmente, sua irmã mais velha, sua tia, sua sogra, sua MÃE, sua VÓ, já pagaram, ou conhecem uma amiga que pagou, paga ou pagará.
Como diz certa pessoa que ocupa certo cargo público:
E DAÍ?
Mulheres TAMBÉM tem todo o legítimo direito de ter sexo casual, zero compromisso, sem amor, sem romance, e mesmo com uma grana envolvida.
E nem sempre pagam com dinheiro. Podem pagar com afeto mesmo, generosidade, abertura de portas.
A diferença é que mulheres não possuem o comportamento predatório que homens possuem. Homens consomem prostituição para subjugar, violentar, agredir se auto-proclamarem alfa, e realizarem humilhações.
Bem, das poucas vezes que pude pagar por um programa, acabei namorando com uma delas, e com a outra, ia pra falar da minha vida. Eu tinha sei lá, 23 anos. E não adianta vir agora me pagar sermão de fada sensata. Já tá feito, a vida é assim, o mundo é assim, lamento, não vou mudar minhas narrativas pra agradar público millenial.
Fato, que o filme traça a silhueta psicanalítica dessa mulher, que na verdade, representa muitas. Mais velhas, anos e anos de relações monogâmicas, onde o amor e a admiração acabaram. Onde romance não leva a lugar nenhum, e muitas vezes pagar para ter um pouco de gentileza e SER GENTIL COM ALGUÉM, revelando que sim, você ainda é um ser humano capaz de ser gentil pra alguém, e a solidão dessa mulher, foi um mergulho dos mais incríveis que pude ter nessa série. Mistura tudo, amada. Solidão do casamento, solidão da idade, solidão de fim da carreira.
Muito embora a escrita mulheres como Phoebe Waller-Bridge (Fleabag), Tina Fey e Amy Sherman-Palladino (Mrs. Maisel) tenham mudado muito meu olhar na dinâmica dramática do filme, eu gosto muito
de como Ryan faz essa narrativa, que pende para o olhar dela, e não dele, o michê.
Sensível pra caralho.
Por isso, recomendo, tá de bob, pega e vê.
Ah, mas eu tenho filtros, militância, etc, gatilhos.
Não sei como ajudar. Eu não sei como se resolve isso, com essas coisas que essa geração tem. Posso respeitar, mas não posso, sinceramente, ajudar nisso.
O ser humano é a contradição. Avisem isso, aos movimentos.
Não somos heróis. Somos falidos, em nossos espaços íntimos. E é uma pena que as redes sociais nos maqueiem tanto.